Não há nada de absurdo em alguém gostar realmente de uma banda, tecer elogios constantes e cobrir cada passo do grupo como algo fundamentalmente relevante. Aqui neste espaço o melhor exemplo talvez seja os pernambucanos do Nuda. Conheço os caras, sou amigo deles, gostei muito do som antes de conhecê-los e acho que minhas críticas foram quase sempre bem positivas. O que não significa que estão imunes se lançarem algo que não me agrade. Se isto acontecer, terei que fundar meu texto em argumentos da mesma forma que o faço quando elogio.
Sempre tomo muito cuidado com a “brodagem”. É bem delicada a aproximação às vezes inevitável do jornalista e do músico. Lidar com críticas nunca foi uma das maiores habilidades do ser humano e a possibilidade de criar um mal-estar é grande. Brodagem entre jornalistas e bandas é algo comum há bastante tempo. O Forastieri escreveu sobre isso. Problema é quando parte pro lado ruim: só falo bem da banda tal e vou fazer o que puder pra ajudar os caras. Deixa de ser jornalismo, vira outra coisa.
Mas o foco aqui é outro. A foto do Macaco Bong que ilustra o texto não é uma provocação. Respeito os caras, tenho amigos que são – eita – brothers deles, etc. Só não gosto do som. Vi show, ouvi o disco. Não acho que mereçam essa ovação quase unânime que a mídia alternativa dá. Também não são ruins. Nem tudo é maniqueísmo. Ninguém precisa viver de extremos.
Eis o principal problema da tal “cena” alternativa brasileira: ou a banda é “um lixo” ou é “a oitava maravilha do mundo”. Quando um grupo consegue ultrapassar as dificuldades iniciais, lançar um disco profissional, conquistar respeito na própria região e alcançar certo reconhecimento nacional, “entrar no círculo”, pronto. Torna-se praticamente uma afronta “ousar” fazer alguma crítica.
Parece claro que existem muito mais bandas “ruins’, defenestradas aos montes, do que grupos “protegidos” por aí. Verdade. Verdade também que falta à cena brasileira uma auto-crítica, uma transparência de ideias, uma discussão intelectual mínima. O que há é a eterna querela dos festivais, de como entrar na roda, como fazer sua música chegar a x ou y. “Quem tá fora quer entrar mas quem tá dentro não sai”. Uma entrevista que circulou bastante no meio e rendeu discussões interessantes foi essa. E sobre música, ideias, ninguém fala? Não há embate? Divergências? E o resto das coisas que não envolvem só o mercado e a sonoridade, cade?
Tudo é muito bom. Todos são amigos demais. As relações são próximas em demasia. Parte disso, creio, deve-se a uma necessidade gritante de ainda se solidificar. Da “colaboração mútua” construir uma coisa nova, forte, boa pra todos, que ainda não existe. Como se através da auto celebração tudo ficasse mais fácil. É válido, mas não pode se resumir aí.
Falta questionamento entre as próprias bandas. Falta confronto de opiniões bem argumentadas. Falta gente que tem coragem de dizer o que pensa. Nunca vi uma “cena” tão bunda-mole quanto essa. Saber dialogar e defender ideias às vezes contrárias sem levar pro pessoal e pra falta de respeito. Transformar isso em algo além. Dialética, afinal. Não é necessário sacrificar amizades por isso. Como também não é preciso puxar o saco de ninguém e forçar uma relação jornalista-banda, banda-banda, banda-público, produtores, etc. Num mundo razoavelmente aceitável devemos conseguir ouvir críticas sem cair em ofensas e infantilidade. E se alguma rusga mais séria acontecer, lidar bem com isso.
O oba-oba não favorece ninguém. A pasmaceira eterna não move nada. Para além do circuito de festivais, das reuniões do Fora do Eixo, etc, há que se ter uma postura que hoje inexiste. Natural, obviamente. Se não existe é porque é fruto de quem a faz. Tá na hora de acabar com o politicamente correto e a acomodação. Sair do universo seguro que foi criado. Aí, quem sabe, poderemos atingir a maturação. Difícil, complicado, enfrentar questões que ninguém quer, mas necessário. Contribua.