Foto: Tacio Philip
É impossível explicar para quem não gosta, ou nunca gostou de metal, o que o estilo significa. Dizem que quem não curte metal na adolescência é estranho, e quem continua a gostar depois dos 30, é burro. Esse “ditado” – preconceituoso – é derivado de um que fala a mesma coisa sobre a postura política. Na verdade, se tirarmos a casca de radicalismo que ele contém – o mesmo radicalismo da maior parte dos fãs do estilo – ele revela na verdade uma mudança.
Não pretendo dar aula de história do metal aqui, mas basta dizer que o estilo surgiu na cidade industrial e operária de Birmingham, na Inglaterra, nas mãos de 5 miseráveis que viriam a formar o Black Sabbath. Ozzy, no início da banda, não tinha sequer sapatos para calçar direito. Estavámos no final da década de 60/início de 70. A cidade havia sido muito destruída pelos bombardeios da segunda guerra mundial e, naquele período, ainda se reconstruía em meio ao clima “flower power” de amor e felicidade hippie que constrastava brutalmente com as condições de vida e trabalho daquele lugar cinzento no Reino Unido.
O metal, em suma, nasceu como um movimento de reação a aquele clima irreal que os hippies pregavam. Os integrantes do Sabbath cansaram de dizer que toda a ambientação da banda (letras, som, imagem, temas, etc) era consequencia do que eles viviam na prática, resultado do momento nada feliz que o mundo vivia. Ou seja: nasceu da miséria, da classe baixa, como movimento de protesto, revolta, rebeldia, trazendo um som mais sujo, soturno e pesado do que tudo que existia na época. Era o canal para fluir a frustração, os anseios e incertezas daquela geração, que continuou a ecoar nos anos posteriores.
Vi um fã, não sei onde, uma vez dizer: “o metal vem da desgraça”. Em parte, ele não poderia estar mais correto. É por isso que o mundo do metal é um universo totalmente “estranho” e “particular” no mundo da música. Ele não depende nem participa do mainstream, não toca em rádios, não é adorado por jornalistas “cool, cults, espertalhões” e não goza da simpatia de muitos.
Tudo isso ao mesmo tempo em que cria seus próprios ícones, ídolos, estilo de vida, suas características, qualidades e babaquices, estereótipos, etc. O maior problema do metal são seus fãs. A molecada que começa a conhecer o estilo invariavelmente se torna extremamente radical, não aceitando qualquer outra manifestação musical que não seja aquela que passa a ser a razão do sujeito existir. Algo parecido com o que ocorre com a religião e o futebol. Daí que a frase “metal is my religion and my law” – o metal é minha religião e minha lei – repetida a exaustão ao redor do mundo, não é só figura de linguagem.
Eu, mesmo gostando muito de metal desde bem cedo, nunca fui o tipo que só ouvia isto ou que me tornei um radical de viseira (como as que se colocam em cavalos). Felizmente, e sem querer parecer arrogante, minha cultura geral sempre foi vasta o suficiente para manter minha cabeça aberta a várias outras coisas. Nada que tirasse, ou que vá tirar, a importância do metal em minha vida.
Escrevi durante 6 anos e continuo a colaborar para o maior site brasileiro do estilo, o Whiplash!. Ouvi e resenhei muito CD, bem como assisti a muitos shows internacionais. Tenho orgulho de tudo que escrevi para o Whip e até hoje me surpreendo com a qualidade de certos textos (quando os revisito), como também me envergonho de vários. Coisa normal para quem escreve. E, pensando na minha idade quando comecei…bem, é razoável.
Com o tempo, fui perdendo a paciência com o público do gênero. A quantidade de estupidez, ignorância e imbelicidade acumulada é absurda. Ainda bem que uns 25% de quem ouve metal é justamente o contrário desta maioria.
Chegando ao Iron Maiden…já havia assistido muitos nomes de peso no meio, mas nenhum com a importância e a história da Donzela de Ferro. Nestes casos, você não vai simplesmente a mais um show internacional. Não. Há muitas lembranças, sensações e sentimentalismo envolvido. A quantidade de memória afetiva que se carrega para um evento destes é inevitável. A ponto de, admito, ter me emocionado logo quando chegou o refrão de “Aces High”, a primeira música. É somente a segunda vez que me emociono assim em shows. A primeira, explica-se, foi com Roger Waters (Pink Floyd). Meu ápice de realização até hoje por tudo que já escrevi por aí sobre o assunto.
Talvez mais que qualquer outro estilo musical, você percebe que quem está ali está por AMOR A MÚSICA. O fã de metal quer saber TUDO sobre seu ídolo. Pesquisa, le, conversa, troca informações, etc. Como apaixonados pela música, a incidência de brigas e coisas do gênero são muito menores em shows do estilo. Para quem não conhece, ou ve de fora, deve se assustar com as rodas de mosh, aparentemente violentas, mas que em 90% dos casos é apenas diversão.
Ao longo do tempo, o fã do Maiden já ouviu todos dos discos da banda, já viu todos os DVD’S, leu dezenas de entrevistas, matérias, reportagens, histórias, etc. Quem não foi, se rói de remorso por ter perdido o Rock In Rio, em 85 e 2001. Especialmente o da década de 80. Aquela turnê. Aquelas músicas. E, de repente, eles resolvem revivê-la. É a “World Slavery Tour” de 1985 transformada na “Somewhere Back In Time Tour” de 2008/2009, acrescida dos clássicos pós “Powerslave” e numa produção sensacional, além da maturidade do grupo. Basta dizer que, daquele show no RIR I, apenas três músicas nao estiveram no set list atual: “Running Free”, “Revelations” e “Flight Of Icarus”.
Mas, sem dúvida, o set list atual é superior, porque acrescido e melhorado.
Assistir a banda pela primeira vez na capital do seu país também teve um sabor a mais.
Resumindo…o metal já deixou de ser, há muitos anos, o meu principal cardápio musical, mas segue sendo – e sempre será – um dos estilos mais apaixonantes do mundo, capaz de proporcionar momentos inesquecíveis como poucos.
É maravilhoso viver um momento histórico. Se você entende – e sente – o que digo, parabéns. Se não, se o metal não passa de barulho insuportável e coisas do tipo para ti, desculpe-me, mas além de ignorante…azar o teu.
20.03.2009. A great day.