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O rock psicodélico moderno dos espanhóis do Persons

Conheci o pessoal do Persons através da indicação do New Hispanic Music, que acompanho há algum tempo. Com disco fresquinho no mercado, “Ghettoblaster” bateu bem aqui. As 8 músicas do disco exalam uma mistura que passeia pelo psicodélico dos anos 60/70, o dub e ritmos latinos em geral com uma camada extra de texturas eletrônicas, gerando um caldo pra lá de interessante. Todas estas referências e rótulos, no entanto, me parecem insuficientes não apenas para o Persons como para várias outras bandas que, imersas no que se convencionou chamar de pós-modernidade, a própria época em que vivemos, produzem coisas que, ainda que bebam em fontes conhecidas, caminham por estradas diversas.

O que me agradou na banda é bem nítido: a cadência das composições e a produção “quente”,  que valoriza cada camada do trabalho. Cada intervenção do baixo – bem destacado em toda a obra, o que é sempre um alívio e um charme a mais – a progressão da bateria, a contribuição do teclado, dos efeitos e da percussão.

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A última faixa, “Monos Lobos”, é perfeita para ilustrar isso. Que aula de cadência e desenvolvimento. Lembra o Pink Floyd na fase de transição pós saída de Syd Barret até o Dark Side Of The Moon. Lembra o Radiohead, quando consegue fazer isso. “Nikola Tesla”, a única inteiramente instrumental, é outro exemplo. O disco todo rescende a uma pegada krautrock  e sua ênfase no desenvolvimento instrumental. Por trás, o Persons coloca um acento de Can, Neu! e Amon Duul II. Na superfície, é pop, nos vocais envolventes de Juan Salamanca.

“Anaconda”, a abertura, é perfeita. E cada vez que ouço gosto mais. “El Hueco” ressalta a qualidade dos riffs que produzem e, sobretudo, das bases que nunca são óbvias demais. Cada canção de “Ghettoblaster” traz uma característica única, um charme diferente.

“Ojos de Léon” é um nítido destaque. A faixa com mais “punch” do disco, tem um refrão sensacional que cresce numa catarse instrumental pra lá de convidativa. É o tipo de coisa que eu aprendi a amar desde cedo. “La Luz”, além de ser a mais fraca do disco, peca por estar logo na sequencia de “Ojos…”, servindo como anticlímax.

Mas aí as coisas voltam aos eixos com “Ley Marcial”, o primeiro single e sua estrutura mais tradicional, com cara de isca para as rádios e a contribuição de Raquel Muñoz. “Volar un Dia” é a minha outra preferida. Faixa deliciosa, com uma abertura que te pega pelo pescoço e tem o desenvolvimento ideal de climas. Dá vontade de voltar muitas vezes.

Com um senso apurado entre a melodia e o punch, o Persons (de Madrid) é uma gratíssima surpresa. Com um disco de alto nível de replay. Ouça:

Jornalista investigativo, crítico e escritor. Publico sobre música e cultura desde 2003. Fundei a Movin' Up em 2008. Escrevi 3 livros de contos, crônicas e poemas. Venci o Prêmio de Excelência Jornalística (2019) da Sociedade Interamericana de Imprensa na categoria “Opinião” com ensaio sobre Roger Waters e o "duplipensar brasileiro" na Movin' Up.

Published in Descobertas