Desde 2002, pela participação no festival Abril Pro Rock, o Mombojó conquistou público cativo e o respeito da crítica, chegando a dois discos muito elogiados e fundamentais na última década de música “alternativa” no Brasil: “Nadadenovo”, de 2004 e “Homem-Espuma”, de 2006. O grupo pernambucano cravou rapidamente seu nome entre os principais do país com uma música que procura algo além do convencional sem no entanto cair em pretensões exageradas.
Após lançar a estreia na revista OutraCoisa, de Lobão, distribuída em bancas e assinar com a Trama para o segundo disco, a banda viu-se “sozinha” para a gravação de “Amigo do Tempo”, recém lançado para download grátis e audição no site oficial. O disco, aguardado com alta expectativa, já começa a colher elogios. A obra chega após diversas mudanças significativas: o multiinstrumentista Rafael Torres faleceu em 2007, vítima de um infarto. E Marcelo Campelo, igualmente multiinstrumentista, deixou o grupo em 2008. Os dois, além de ótimos músicos, eram contribuições fundamentais para as composições e a identidade musical da banda.
Veio também a mudança de Recife para São Paulo. E na busca de recursos para gravar “Amigo do Tempo” – após tentativas sem sucesso – o Mombojó acabou por trilhar o caminho literalmente independente: tirando do bolso todos os custos de produção. Após tantas turbulências e transformações, o quinteto formado por Felipe (voz), Chiquinho (teclado), Marcelo (guitarra), Vicente (bateria) e Samuel (baixo) atinge a inevitável maturidade.
Sobre tudo isso, Chiquinho falou à Movin’ Up, a seguir.
Movin’ Up – Como o Mombojó se reorganizou após uma década de carreira, o reconhecimento nacional, os momentos difíceis que todos sabem, o próprio amadurecimento natural do período e os 4 anos de hiato até “Amigo do Tempo”?
Chiquinho: Voltamos a ser uma banda independente. Ou, melhor: cada vez mais dependente do nosso público. Apostamos muito na ideia de que devemos estreitar muito a relação com o nosso público, tendo a internet como a maior e melhor ferramenta para isso. Passamos por muita coisa nesses últimos tempos, mas nunca deixamos o espírito de pensar pra frente. A ideia é de cada vez nos tornarmos uma banda auto-suficiente e de bem com seu público.
Movin’ Up – Como foram estes quase 2 anos de adaptação em SP? Um processo que muitas bandas fazem, com maior ou menor “tranquilidade”, digamos. Qual o saldo da mudança até hoje e como a cidade influenciou nas músicas do novo disco?
São Paulo é a cidade que tá mais perto do resto do Brasil, falo isso até geograficamente também. Aqui as coisas acontecem de forma mais dinâmica. Todo dia tem alguma coisa pra ver, algum trabalho pra fazer, alguém diferente pra conhecer. Achamos que seria fundamental para nossas carreiras nos aproximarmos mais dessa realidade. Mas, vale lembrar que é sempre muito bom voltar pra Recife e, de certa forma, ajudar nossa cidade a crescer.
Movin’ Up – O álbum soa bem orgânico, coeso. Envolvente tanto na própria estrutura e melodia das músicas quanto na ordem em que estão apresentadas. Isso é algo que vocês se preocupam, foi proposital? Nos tempos atuais, quanto o “formato disco” e todas as implicações que ele traz ainda é importante para a banda?
Acho legal se pensar o disco como uma obra completa que faz sentido ouvir todo numa ordem. Entendo que cada vez mais as pessoas escutam mp3 avulsos por aí, normal… eu também faço isso. Porém, é massa conseguir enxergar cada música fazendo parte de um todo.
Movin’ Up – Como o universo sensório do grupo está presente nas letras?
Acho que todos temos uma viagem muito visual das músicas. Parece que sempre pensamos antes nela num clipe, ou no palco com as luzes grandiosas.
Movin’ Up – Como a produção (bem boa, aliás) procurou equilibrar os diversos instrumentos e caminhos apontados pela música de vocês? Qual o caldo de “Amigo do Tempo”?
Acho que esse equilíbrio é algo que prezamos desde o primeiro disco. Todo mundo respeita e confia muito um no outro. Passamos a usar cada vez mais e melhor o silêncio, por exemplo. Não tenho que tocar o tempo todo, nem Felipe precisa só cantar, Vicente pode tocar outras coisas além da bateria.
Movin’ Up – Todo artista gosta de pensar que “meu melhor disco é sempre o último”. É difícil apontar um destaque flagrante em “Amigo do Tempo” já que todas as faixas parecem ter seu sentido particular e sua importância. No entanto, pra vocês, quais as que tem mais carinho e qual a sensação do trabalho realizado?
Uma correção “meu melhor disco é sempre o PRÓXIMO”. Estamos realmente muito felizes de ter chegado até aqui com nossas próprias pernas. Há um ano, confesso que achava isso uma tarefa quase impossível! Fazer um disco inteiro com recursos próprios…e ainda tinha que ficar bom! (risos).
Eu gosto muito da primeira (nota do E: “Entre a União e a Saudade”, título sintomático para abrir o disco) talvez porque é uma música que conta com a participação de Rafa ainda (Rafael Torres, RIP). Conseguimos aproveitar um violão que ele tinha gravado. Mas, gosto muito de todas…e das outras que ficaram de fora pro próximo disco.
Movin’ Up – O teclado é um instrumento pouco utilizado atualmente: seja por desconhecimento, seja por preconceito, por desinteresse ou falta de qualidade. O Mombojó, ao contrário, sempre trabalhou bem o instrumento. Gostaria de saber um pouco mais sobre o papel do teclado nesse disco.
Todos os instrumentos tem o seu papel fundamental nos nossos arranjos. Hoje em dia eu viajo que Marcelo virou um guitarrista que tira som de cordas que nem parece que é uma guitarra mesmo. Sou fã dos synths, mas acho muito foda quando conseguem tirar um som diferente de um instrumento mais comun. Nesse disco temos umas particularidade que Felipe e Samuel também gravaram teclados. Eu, Marcelo e Vicente cantamos em outra música. Mombojó funciona, hoje, mais como 10 braços e 10 pernas pra tirar som, seja lá em que instrumento for.
Movin’ Up – Qual a expectativa para “voltar” aos palcos definitivamente como Mombojó? Como imaginam a recepção do público para as novas músicas?
Espero que curtam tanto quanto a gente está curtindo este momento de fazer tudo: projetar a ordem das músicas, as luzes, o cenário. Se a empolgação for contagiante, estaremos bem.