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A “nova” música brasileira confirma: é apolítica, covarde e tacanha

Por Maurício Angelo

E eis que o país entra numa espiral de manifestações, que milhares de pessoas tomam as ruas, que os governos são desafiados na sua zona de conforto, que a mídia é obrigada a ir além da sua versão oficial, que a juventude – e literalmente a juventude – decide se rebelar contra tudo e contra todos. Destrinchei isso um pouquinho aqui.

Diante de tudo isso, os representantes da “nova música brasileira” – vamos colocar, assim, artistas que lançaram seus primeiros discos nos últimos 15 anos – confirma aquela impressão antiga: é apolítica, incapaz de se posicionar com um pingo de relevância para além do senso comum, covarde, porque evita comprometer a sua boquinha seja lá qual for e tacanha, já que se apequena ainda mais num momento em que deveria aparecer.

Que artista brasileiro com algum alcance de público consegue dialogar decentemente com essa juventude que está nas ruas? Nenhum. Restam alguns poucos nomes “alternativos”, pra lá de tímidos, que falam pouco e especificamente para um certo nicho de gente. Restam centenas de artistas da periferia que costumam ficar restritos na periferia.

Todo artista precisa se posicionar? Não. Todo mundo precisa ter uma opinião política formada e/ou se engajar em tudo que está acontecendo? Não. Mas, em tese, amigo, ninguém é obrigado a nada. Esse mundo é plural demais e a atualidade é recortada, estilhaçada e se acumula em nichos, panelas e caminhos diversos.

SP

Por outro lado, é muito seguro ficar ali no seu cantinho, caladinho, quietinho, sem querer se comprometer demais, sem se arriscar. É o que essa geração de artistas faz. Em parte – e especialmente em SP – é porque tem o rabo preso com certa ala do governo, porque ajudaram a eleger Haddad, seja diretamente seja em atos “sem liderança”, como a balela indie-esquerdinha que foi o ato “Amor Sim, Russomano Não” na Praça Roosevelt, alguns meses atrás. A mesma praça em que a polícia de Haddad (e de Alckmin) sentou a borracha, bombas e gás nos manifestantes. Por algum medinho torto e burro de perder a bocada das leis de incentivo, patrocínios, eventos e apoio.

Em suma, essa geração só se manifesta quando convém. Quando aquilo atende aos seus interesses. As leis e etc e tal devem existir, sim. O problema é o artista ser refém delas. E isso afetar até sua capacidade de se manifestar.

Se a “nova” MPB se apequena, a velha também parece muito cansada para arriscar algo. É até compreensível. Já fizeram bastante. Mas se, entrementes, já se dizia que essa geração de compositores é muito “piá de prédio”, “leite com pêra” e etc, em suma, mimada no mais amplo sentido possível do termo, surpreende que seja incapaz de tomar parte em protestos em que a classe média é maioria.

O que não fazem em estúdio e nos palcos, não fazem nas ruas. Como diz a sabedoria popular: de onde menos se espera é que não sai nada mesmo.

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Jornalista investigativo, crítico e escritor. Publico sobre música e cultura desde 2003. Fundei a Movin' Up em 2008. Escrevi 3 livros de contos, crônicas e poemas. Venci o Prêmio de Excelência Jornalística (2019) da Sociedade Interamericana de Imprensa na categoria “Opinião” com ensaio sobre Roger Waters e o "duplipensar brasileiro" na Movin' Up.

Published in Cena BR