Por Maurício Angelo
Todos nós – ou quase – amamos Martin Scorsese. Responsável por um punhado de clássicos, é um diretor extremamente “cool”, uma enciclopédia da história do cinema, seja em documentários, livros, muitas contribuições para a música (The Band, Michael Jackson, Rolling Stones, George Harrison, Bob Dylan) etc e tal. Aos 71 anos – novo demais, diga-se – continua produzindo bons filmes e encontrou em Leonardo Di Caprio o seu novo Robert De Niro (com quem realizou 6 filmes entre as décadas de 70 e 90). “O Lobo de Wall Street” marca a quinta parceria entre Scorsese e Di Caprio e, infelizmente, figura entre os piores filmes da carreira do diretor, fácil.
Baseado na história real de Jordan Belfort, um corretor da bolsa de valores que enriqueceu aplicando golpe em muita gente (e que vai usar os royalties que ganhou com o filme para pagar parte das suas vítimas), o filme aposta suas três horas em destrinchar não só a ascensão, os métodos e a esperteza de Jordan, como a vida loka sem limites que o sujeito tinha, junto com os amigos e parceiros na Sttraton Oakmond, a firma que fundou em sociedade com Donnie Azoff, vivido por Jonah Hill. Apesar de ser uma aproximação de Jonah com o “drama” (leia esta boa matéria do Guardian), a verdade é que o personagem dele é totalmente cômico, assim como o filme aposta mais na comédia e nos exageros que em qualquer outra coisa.
A “polêmica” que o filme causou parece pouco em função da ruindade da coisa em si. Há nudez e sexo o tempo inteiro, orgias diversas (inclusive orgia gay), consumo de todo tipo de drogas e 300 palavrões por segundo. Logo no início, Di Caprio cheira cocaína (dentro da) bunda de uma prostituta, por exemplo. E as cenas do tipo aparecem em profusão. Na real, nada que deveria chocar muita gente.
Tudo isso é detalhe perante as opções terríveis do roteiro (de Terrence Winter), acatadas e reforçadas por Scorsese na direção óbvia, nada sutil, nada digna do que ele já fez. A onipresente narração em off de Belfort é insuportável, assim como a opção por conversar diretamente com a câmera, explicando as coisas para o espectador. Esta é uma espécie de praga no cinema mundial atualmente, seja lá fora ou mesmo no Brasil. O espectador é tratado como um completo imbecil, incapaz de notar qualquer coisa por si só, que precisa que o personagem explique as coisas diretamente pra ele, narre tudo em off e a câmera ainda aponte para os “detalhes” do que está acontecendo. Só falta aquela setinha na tela dos programas de humor.
São 3 horas em que esses recursos aparecem de forma onipresente. Claro, é fácil dizer que “sutileza” era algo que não cabia para o argumento que se baseia “The Wolf Of Wall Street”. Mas os problemas vão muito além disso. Parece um filme dirigido por um juvenil. O exagero e a comédia – da qual a cena de Leonardo Di Caprio chapadão rastejando de volta para o seu carro ilustra bem – não funcionam mesmo considerando tudo que cerca o filme, o roteiro, a época, a história original, etc. O histrionismo é igualmente onipresente, com os personagens gritando o tempo todo. Competente, Di Caprio entrega o que dele se espera, encarnando um legítimo pregador do capitalismo em muitos momentos. Jonah Hill, caricato, está à vontade no papel, longe de sair da sua zona de conforto, como esperado. E Margot Robbie, a beldade pinçada por Scorsese para viver a esposa de Di Caprio, que aparece nua com frequencia, é uma atriz ok. Nem (a nudez dela) salva isso aqui.
Além de ruim, The Wolf Of Wall Street é irritante, pedestre, limitado, forçado, excessivamente longo e exagerado para além da dose de exagero que o argumento pedia. É um filme que grita a sua limitação e suas opções terríveis na sua cara o tempo todo. Me parece temerário premiar esta obra em qualquer aspecto. Representa (muito) do que pode ser considerado abominável no cinema americano atual. Um erro crasso de Scorsese.